E lá se vai um cantor rumo as “portas do sonho”

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A lamentável notícia do falecimento hoje ocorrido (02/05/2018), de Mário Barbará Dornelles, correu “desgarradamente” pelo Brasil afora.

Foram quase sessenta e quatro anos de convivência dos apreciadores de boa música com o compositor musical são borjense nascido aos 22 de outubro de 1954.

Poucos, como ele, foram protagonistas atuando nos diversos cenários da música gaúcha.

Desde concursos carnalavescos – São Borja e Porto Alegre – 1971 e 1972-, festivais de música estudantil – MUSI-PUC 1973 – FEE – Três de Maio/RS 1976 – até emplacar uma Calhandra de Ouro em 1975 na 5ª Califórnia da Canção juntamente com seu parceiro letrista Aparício Silva Rillo foram inúmeras aparições do artista.

A composição premiada naquela ocasião foi “Roda Canto”. Mário subiu ao palco juntamente com Sérgio Rojas acompanhando a interpretação de Luiz Eugênio:

“…Meu canto chega de longe,

do pai do pai de meu pai

Sangue, sol, sêmen, semente,

roda-rodando se vai… “

De tanto participar do então “Evento Máximo” da música gaúcha (Califórnia da Canção), Mário Barbará “deu um tempo” entre 1979 e 1981 depois de ter vencido “linhas de premiação” também em 1977 e 1978, sempre em parceria com Rillo.

Insculpiu sua marca “alternativa”, conduzindo o show “Barbará e Saracura” com exibições consideradas até hoje avançadas musicalmente (1980). Foi um sucesso de crítica e público.

Depois desta breve ausência nos festivais, em 1981 retorna aos palcos exuberante. Exibe-se na 11ª Califórnia com “Desgarrados” letra de Sérgio Napp (que a partir dali viria a ser seu parceiro histórico) onde assinou a melodia deste clássico.

A composição era uma síntese narrativa poética de contraponto entre a cidade o campo. A história triste, mas real, do êxodo rural e da sina de milhares de gaúchos que ao se depararem com a realidade urbana sucumbiam à própria sorte.

Com a interpretação e a vitória ganhou notoriedade. Realmente foi uma aula completa de talento ousado. O que se sucedeu foram elogios e algumas críticas. Não preciso falar que todas as aversões a composição morreram pelo caminho do nada.

Em entrevista para a edição do livro de biografias “Som do Sul”, de Henrique Mann (Editora Tchê, Porto Alegre, 2002) Mário Barbará sintetizou a sua obra em tom altruísta no que diz respeito à música:

“Uma vez eu pensei em preservar as minhas músicas. Depois reconsiderei. Hoje eu acho que todo mundo que quiser, deve gravar, mesmo que eu não goste do resultado, porque estes clássicos como Desgarrados já têm vida própria.” (sic.)

Neste mesmo ano, aventurou-se pelo Festival Nacional MPB SHELL com “Velhas Brancas” que também marcou sua carreira.

Em “Portas dos sonhos”, composição em parceria com Sérgio Napp e que foi gravada também pelo amigo Vitor Hugo, a síntese da vida do homem/artista:

“Quando abro as Portas do sonho

sinto gosto da liberdade,

pés descalços, camisa aberta,

mesas postas pelas varandas…”

Outros festivais se vieram. Coxilhas, Musicantos !!!

Outros shows e aparições.

Em todos eles o grande músico deixou sua marca.

Veja algumas das principais canções: “Roda Canto”, “Campesina”, “Era Uma Vez”, “Colorada”, “Querência Maior”, “Portas do Sonho”, “Mala de Garupa”, “Onde o cantor expõe as razões do seu canto”, “Retirante”, “Laços”, “Se eu me chamasse Lourenço”, “Velhas brancas”, “Xote da Amizade”, “Xote da ponte”, “Xotes do sul”, “Amanhã será setembro”, “Canto de clã”, “Gaúcho bronze”, “Inverno”, “Numa estação”, “Quando eu fui embora”, “Couro cru” e “Na Rodilha do Laço”.

Em 1998 se retira do mundo artístico e retorna a sua terra natal para cuidar dos negócios da família.

Em 2017 lançou juntamente com seu conterrâneo amigo/irmão Chico Saratt o projeto Desgarrados. O nome do DVD não foi coincidência.

Com ele, a dupla recebeu em 2017 os prêmios “Melhores do Ano”, do Blog Repórter Farroupilha, na categoria DVD além de ser indicado e ter vencido o Açorianos de Compositor de Música Regional.

Como último ato apresentou-se na 40ª Califórnia. Primeiro levaram ao público o seu show derradeiro. Era dezembro de 2017, na cálida Uruguaiana quando Chico e Mário subiram ao palco o Teatro silenciou em expectativas.

A composição entregue a dupla por Gilberto Carvalho e Lenin Nuñez intitulada  “Tatuagens”, sem trocadilho, foi a marca definitiva:

“Lições dos meus ancestrais,

que foram fundamentais

assegurando caminhos.

Colhidos nesta vivência,

que me entregou na experiência

muito mais flores que espinho.”

 

Mário vai enfim para a “Querência Maior” ao encontro de antigos parceiros, Rillo, Napp.

Nas portas daquele rincão certamente será bem recebido. Recorrerá ao violão, fará uma composição com “Pedro”.

Uma toada talvez. Uma canção. Mas isso não saberemos !!!!

Por isso, aquilo que nos cabe nas lições de “Era uma vez” de Aparicio Silva Rillo:

“…Acenda velas quem não sabe o resto

Da velha história que eu cortei ao meio

E ao pé das velas deixe fumo em rama

Para…

 

MÁRIO BARBARÁ DORNELLES.